Empreendedores da Geração Y querem mudar o mundo

Descompromissados. Pessoas que só pensam em si mesmas e que gastam seu dinheiro no Starbucks, em vez de comprar um imóvel. Os millennials, ou geração Y, que comportam aqueles nascidos entre 1981 e 1995, são frequentemente rotulados dessa forma. 

Mas a verdade é que esses jovens, que compõem cerca de 50% da força de trabalho atual. Os empreendedores da geração y, apenas têm valores diferentes daqueles das gerações anteriores.

Segundo uma pesquisa da Deloitte, 75% dos integrantes dessa geração acreditam que as empresas estão preocupadas demais com seus próprios objetivos e pouco comprometidas com a sociedade, com as pessoas e com
valores.

Para eles, é preciso pensar no impacto social e ambiental de um negócio. “Esse é um caminho sem volta, portanto, será prioridade para todas as gerações que estão por vir”, diz Jade Utsch, CEO da RadarFit, uma empresa que desenvolveu uma plataforma para promover hábitos saudáveis.

A discordância com os objetivos das organizações e com o funcionamento do mercado faz com que muitos jovens queiram empreender. Muitos o fazem por necessidade, dada à crise de desemprego nessa camada da população. No entanto, uma quantidade significativa opta por esse caminho por princípio, para trabalhar em algo com propósito. O Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) revelou um aumento de 57% de registros
de novas marcas desde 2019. 

E o número tende a aumentar na geração Z, que vem logo depois da Y – formada por pessoas nascidas entre a segunda metade dos anos 1990 e 2010 – e que começa a chegar ao mercado de trabalho. Segundo levantamento do Global Entrepreneurship Monitor (GEM) em parceria com o Sebrae, 50% desses jovens pretendem ter seu próprio negócio. “São duas gerações mais politizadas e conscientes, que nasceram em um período crucial da sociedade, em que temas como crise climática, racismo,
homofobia, direitos humanos estão em discussão”, diz Arthur Lima, um dos sócios da AfroSaúde, plataforma que conecta clientes e profissionais de saúde negros.

A seguir, conheça empreendedores da geração Y e seus propósitos.

Empreendedores da Geração Y

Anna Luísa Beserra, 25 anos

Sustainable Development & Water For All

Era uma vez uma criança que gostava de observa insetos e perguntar por que o céu era azul. Anna Luísa Beserra soube, portanto, desde muito
cedo, que seria cientista. Aos 15, ela leu “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, e ficou tocada pelo sofrimento das famílias rurais do semiárido brasileiro. Poucos dias depois, viu um cartaz do Prêmio Jovem Cientista e decidiu pesquisar como levar água potável a famílias em locais isolados.
Assim nasceu a Aqualuz, que usa energia solar para purificar a água.

Na faculdade de Biotecnologia, na Universidade Federal da Bahia, decidiu
empreender, incentivada por um professor. “Sempre me vi trabalhando com algo que desse um retorno positivo para a sociedade”, diz Anna Luísa, atribuindo a preocupação à criação que recebeu dos pais, uma enfermeira e um empreendedor.

 A Aqualuz foi apenas a primeira de uma série de soluções voltadas ao tratamento da água desenvolvidas pela Sustainable Development &
Water for All, que já impactou cerca de 18 mil pessoas. “Minha paixão pelo saneamento foi crescendo porque, quanto mais eu tinha contato, mais me apaixonava por entender e tentar resolver os problemas.” 

Vitor Daher, 31 anos

Estúdio Ubuntu | A Muda Social

Formado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Mackenzie, Vitor Daher teve um choque de realidade ao ter contato com alunos de uma escola pública de São Paulo. Daher perguntou qual era o maior medo dos estudantes. Para 25% deles, a resposta foi “ratos”. Aqueles garotos e garotas descreveram os animais entrando em casa, comendo as roupas, a comida e até os dedos dos pés. “Foi muito impactante”, diz.

Ele percebeu que havia um mercado enorme a ser explorado, que permitia melhorar a vida das pessoas. Motivado por esse desejo, abandonou seus planos de passar uma temporada na Austrália e resolveu empreender, com a Muda Social, que faz melhorias em espaços públicos por meio da arte, e com o Estúdio Ubuntu, que desenvolve projetos focados em arquitetura sustentável e bioclimática.

“Nessa época, pensei que eu tinha duas opções: desbravar o mundo
ou fazer algo com propósito, que tivesse impacto social, que pudesse
mudar a vida das pessoas.” Daher, de 31 anos, faz parte dos empreendedores da geração Y e escolheu então fazer a diferença. Atualmente, ele finalmente está passando uma temporada na Austrália, mas tocando os dois escritórios à distância.

Felipe Matayoshi, 31 anos

Pace

“Virei empreendedor por uma paixão”, afirma Felipe Matayoshi, fundador da
marca de streetwear Pace. Ele era baterista de uma banda e se preocupava com o visual. Começou a pesquisar os músicos das bandas de que era fã e a criar suas próprias peças, com a ajuda da mãe, costureira. “Acabou ficando maior que a música”, conta. Em uma viagem para Nova York, comprou pares de tênis de marcas pouco conhecidas e chamou a atenção.

Surgiu ali a vontade de criar as suas versões, no Brasil. Em 2017, nasceu a Pace, que fabrica calçados, acessórios e roupas. A equipe é pequena e multifuncional – sua sócia é sua mulher, Juliana Matayoshi. “A gente é muito motivado, cheio de energia, justo e sempre lidera pelo exemplo.” Matayoshi, afinal, aprendeu tudo na raça, sem ninguém para abrir as portas.

Ele diz não ver muitos empreendedores da geração Y. “Eu teria começado muito mais novo”, diz. Ele acredita que as próximas gerações serão muito mais empreendedoras, por terem nascido em plena era da informação. “Antes, a moda era muito elitista, as oportunidades eram escassas. Hoje, você consegue fazer um trabalho bem-feito, postar nas suas redes sociais, e as oportunidades se abrem.”

Maria Elza Starling, 32 anos

Lifeme

Ser empreendedora está no sangue de Maria Elza Starling, que vendia sanduíche natural e docinhos na época do colégio e bombons na faculdade de Engenharia Química. “Acho que cada vez mais as pessoas têm vontade de empreender, e vejo que na minha geração há mais esse desejo
do que nas gerações passadas.”

Maria Elzansempre gostou de cozinhar. Em 2015, viu-se obrigada a buscar alternativas, devido a uma intolerância à lactose. “Eu procurava
produtos gostosos para comer, e não achava.” Percebeu uma lacuna no mercado e começou a desenvolver produtos para si mesma e para vender. Assim nasceu a Lifeme, em sociedade com Tatiana Veloso Franco.

 A empresa oferece diversas linhas de produtos congelados: sem glúten, sem lactose, low carb, vegano e sem lácteos. São pães, salgados, muffins e brownies, pizzas, hambúrgueres. Recentemente, a empresa lançou também produtos para crianças. Hoje, as gostosuras de Lifeme, baseada
em Belo Horizonte (MG), estão em mais de 400 pontos de vendas.

Arthur Lima, 30 anos
Igor Rocha, 35 anos

AfroSaúde

Empreender nunca tinha passado pela cabeça de Arthur Lima. Mas o dentista não se sentia representado em sua área, pela falta de protagonismo dos negros no setor da saúde. O jornalista Igor Rocha, por sua vez, tinha experiência com comunicação voltada ao empreendedorismo. Mas, como paciente, sentia a mesma lacuna.

“Sou uma pessoa negra morando em Salvador, onde mais de 80% da população é negra, e nunca tinha sido atendido por um médico ou médica negra, por exemplo, mesmo tendo alguns programas de saúde específicos para pessoas como eu”, diz Rocha. Juntos, eles pensaram em dar espaço para o profissional de saúde negro, que encontra dificuldades no mercado, e facilitar o acesso dos pacientes a esse cuidado mais direcionado às questões de raça, gênero e diversidade.

Assim nasceu a AfroSaúde, uma empresa de tecnologia de empreendedores da geração Y, que desenvolve soluções para o setor da saúde com objetivos sociais e organizacionais, com atenção especial à população negra. Trata-se de uma plataforma disponível na internet e por meio de um aplicativo que conecta pacientes e colaboradores de empresas a profissionais de saúde negros de todo o Brasil, desde a busca de profissionais e agendamento até a realização da consulta e acompanhamento.

Jade Utsch, 29 anos
Jennifer de Faria, 32 anos
Tatiany Duarte, 31 anos

RadarFit

Quem nunca sofreu para incluir hábitos saudáveis na rotina? Foi pensando nisso que o trio de jovens (empreendedores da geração Y) pensou no game fitness RadarFit, que ajuda o usuário a cumprir metas de alimentação mais saudável, prática de exercícios físicos, hidratação e meditação, de acordo com seus objetivos. Cada meta alcançada resulta em moedas que podem ser trocadas por prêmios, como aparelhos de TV e celulares. “A RadarFit surgiu de uma vontade de solucionar a dificuldade em ter uma vida saudável”, diz Jade Utsch, CEO da empresa baseada em Belo Horizonte (MG).

Os princípios do projeto passam pela inovação, pela experiência do cliente e pelo capital humano como centro do negócio. “Negócios são feitos por pessoas. Nosso foco é cuidar da nossa equipe, para que ela cuide dos nossos clientes.” Para ela, sua geração vê o empreendedorismo como uma forma de prosperar e construir algo que vai além do patrimônio, como uma solução para escapar à forma tradicional de trabalho e criar melhores condições para quem quer dedicar sua carreira a algo conectado a um propósito.

Thamires Pontes, 31 anos

Phycolabs

“É muito fascinante quando a moda se une à biologia e à química. É possível fazer coisas incríveis que, de fato, podem impactar o planeta de forma positiva”, diz Thamires Pontes, criadora da startup de biotecnologia Phycolabs, que tem, entre seus projetos, o desenvolvimento de fibras têxteis a partir de algas marinhas. A moda é uma indústria bastante poluente – segundo dados publicados pela Bloomberg, só nos Estados Unidos, o setor gera 11,3 milhões de toneladas de lixo têxtil anualmente.

É responsável por 10% das emissões de dióxido de carbono, segundo o Programa de Meio Ambiente da ONU, e de 20% das 300 milhões de toneladas de plástico produzidos anualmente. Thamires, que estudou Moda, apaixonou-se pela área têxtil, acreditando no poder de sua voz como criadora. Foi assim que começou sua pesquisa, que teve apoio do Sebrae e do Senai. Assim, ela pôde colocar em prática seu desejo de empreender. “Não queria depender dos outros para realizar meus sonhos”, diz. Para ela, os millennials e a geração Z estão muito mais abertos a seguir seus próprios caminhos.

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